Mais uma noite de pedal.
Para quem ama pedalar, o início da noite é aguardado com ansiedade e alegria. É hora de deixar o carro na garagem, o estresse para trás, e se juntar com aqueles que adoram o vento no rosto e a sensação de liberdade.
Rodar de bike nos aproxima de tudo: pessoas, árvores, rios e, na cidade, dos carros, caminhões, ônibus, nem sempre tão amistosos.
Mas isso não importa. Bora pedalar!
Noite dessas, o grupo formado por seis ciclistas – eu e mais 5 amigos – decidiu ir do centro da cidade de Santo André, no ABC Paulista, até o Shopping D, na zona norte de São Paulo, perfazendo total de 50 quilometros entre ida e volta.
Trajeto tranquilo, sem muitas subidas, mas que inclui avenidas movimentadas como a dos Estados.
Saímos de Santo André às 20h, o congestionamento já tinha baixado e, como de costume, ocupamos uma faixa de rolamento das avenidas por onde passávamos, aliás, como determina o Código Brasileiro de Trânsito: bicicletas são veículos, portanto, devem trafegar na rua, onde não há ciclofaixa ou ciclovia, na mesma mão de direção dos carros, porém, nunca na calçada.
Ah, tá, eu sei disso, meus amigos ciclistas também sabem e quem for bem informado e não tiver comprado a carteira de habilitação também tem conhecimento da regra, afinal, está lá, no Código Brasileiro de Trânsito.
Começamos a girar felizes em direção ao nosso destino.
A reação dos motoristas de carro, caminhão, ônibus é impressionante. Se alguns nos incentivam, acenam, desviam para passar longe do pelotão, e nos deixam em paz (como deve ser) na nossa faixa de rolamento, outros se enfurecem, reclamam que estamos “pegando o lugar dos carros”, e há ainda aqueles que nos mandam circular pela calçada… Oi? “Mas, meu senhor, lugar de bike é na rua!”
E tem o povo sem noção, que deve morar em Marte e se materializar de vez em quando no meio do trânsito e que, ao ver o pelotão de ciclistas, vai logo gritando a plenos pulmões: “Vai pra ciclovia!”
“Meu bem, iríamos com toda a certeza, se elas existissem nos trajetos que precisamos que existam, se houvesse plano urbanístico que contemplasse o transporte por meio de bicicletas, sabe, mobilidade urbana?”. Mas as ciclofaixas só existem em poucas avenidas, poucas mesmo.
E na convicção de que temos direito ao espaço nas ruas, continuamos firmes e fortes, ainda que muitos não nos respeitem. Sim, exige certa coragem, porque muitos motoristas aceleram enfurecidos quando veem um grupo de ciclistas e, por vezes, sentimos que se pudessem, passariam por cima de todos nós.
Sempre que algum motorista age dessa forma, penso: “essa criatura deve ter uma vida bem estressante, ser muito infeliz. Afinal, o que a bike na rua fez contra ele?
Gente, vivemos em cidades com trânsito caótico, sem condições de fluidez, porque o número de veículos é infinitamente maior do que a quantidade de ruas para eles circularem. A frota de carros cresceu drasticamente, mas as ruas continuam praticamente as mesmas. A conta não fecha!
Esses mesmos carros poluem absurdamente o ar e provocam todo tipo de barulho, gerando estresse. O óbvio não seria incentivar quem se propõe a circular por aí de bicicleta? Não seria pensar que se mais gente aderisse a esse meio de transporte, o trânsito iria melhorar?
Não seria também uma forma de demonstrar respeito à opção de locomoção do outro? Não seria uma maneira de demonstrar inteligência, já que se o número de ciclistas aumentar, o poder público será obrigado a resolver o dilema do enfrentamento entre motoristas e ciclistas, fazendo o que já deveria ter feito, que é pensar a mobilidade urbana, com foco nas pessoas e não nos carros? E se a quantidade de pessoas pedalando crescer, o número de carros nas vias vai baixar!
E a saúde?
Ah, essa melhoraria muito. Pedalar favorece a musculatura, pulmões, queima de gordura e, acreditem, melhora profundamente o humor e promove a interação entre as pessoas. É maravilhoso!
Se é assim, por que a fúria contra os ciclistas?
Bem, sempre penso que tudo passa pela educação. Se um povo não conhece nem o Código Brasileiro de Trânsito, e ignora o respeito ao próximo, certamente irá demorar a associar os benefícios que o aumento de ciclistas em grandes cidades pode significar para todos. Mas a gente não desiste, não! Bora pedalar!
Os grupos de ciclistas urbanos se multiplicam pelo país afora e atraem cada vez mais pessoas. É gente do bem, interessada no bem-estar, saúde e na liberdade.
Em Santo André, temos vários desses grupos, assim como no ABC Paulista e em São Paulo. Os grupos de ciclistas amadores se espalham pelo país, graças a Deus! Eu pedalo com os Lesmas Lerdas, mas também giro de bike com amigos nos finais de semana e com pessoas que gostam de sentir o vento no rosto.
Pense sobre isso, e, se quiser um conselho, pedale você também! Caso o esporte não te atraia, respeite quem pedala, incentive, proteja o ciclista. Isso só trará benefícios a todos!
Por: Sandhra Cabral, jornalista, educadora e ciclista amadora